segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O Arrebatamento da Igreja, Verdade ou Ilusão? - Parte 2/5

 

Parte 1

Por Gustavo Barros

image II) História da Doutrina da Dispensação (como surgiu essa idéia)

Até por volta de 1830 d.C., essa doutrina nunca havia sido ensinada por nenhum círculo cristão. Isso, por si só, já deveria levantar suspeitas - uma doutrina que nunca havia sido revelada por mais de 1830 anos é de se estranhar, não?!

Quem desenvolveu essa teoria foi John Darby:

John Nelson Darby (1800-1882) – Foi o líder britânico de maior influência do movimento separatista Plymouth Brethren. Darby, frustrado com o estado da igreja, começou a liderar esse grupo separatista que cresceu rapidamente. Ele distinguia os sinais da igreja verdadeira como: unidade espiritual, comunhão e obediência à Palavra sob o ministério do Espírito Santo, sendo a igreja que ele liderava, a única igreja verdadeira. Por volta de 1840 houve uma afiada discussão e divisão entre John Darby e os outros líderes desse movimento, divisão essa, causada por questões teológicas e eclesiásticas. Como resultado da divisão, John Darby se tornou o líder de um grupo chamado “Exclusivo”. Darby passou a pregar sua idéia de que a Igreja atual estava num estado de apostasia, e que as profecias do Antigo Testamento deveriam ser interpretadas como para Israel, literalmente, nunca com relação à Igreja, pois a Igreja é apóstata e jamais cumpriu e nem cumprirá aquelas promessas. Ele dividiu a história em sete Dispensações diferentes, na qual cada uma mostrava uma forma diferente de como Deus havia operado Seu plano de salvação. A Dispensação, ou era da Igreja, assim como todas as precedentes, terminaria em fracasso.

Por volta de 1832, começou um movimento carismático na Escócia. Durante um desses cultos, uma menina de 16 anos, Margaret MacDonald, alegou ter recebido uma visão profética na qual ela teve uma revelação especial da segunda vinda de Cristo, e esta segunda vinda seria em duas etapas: 1) Uma, secreta, para levar alguns antes do anticristo; 2) na segunda, Jesus viria para reinar por mil anos aqui na terra. Os ensinos dessa menina se espalharam durante o “reavivamento” carismático na Escócia e Darby visitou o lugar. Lá, ele conheceu Margaret, ouviu seus ensinos apocalípticos e “muitos acreditam que ele aceitou a visão do Arrebatamento e encaixou no seu sistema de Dispensações” (Elwell, Walter - Evangelical Dictionary of Theology - Baker, pg.984).

Após esse encontro com Margaret, juntamente com sua interpretação literal das profecias do Antigo Testamento e seu descontentamento com a Igreja, Darby passou a pregar que a segunda vinda seria em dois estágios: o primeiro seria um arrebatamento invisível dos crentes verdadeiros, que poderia acontecer a qualquer momento, e encerraria a Dispensação da Igreja. Uma vez que a igreja fosse levada, isso abriria a porta para Israel receber as promessas do Antigo Testamento, e iniciaria a Grande Tribulação. O segundo estágio, o retorno final de Cristo, seria quando ele estabelecesse por mil anos o Reino de Deus aqui na terra, manifestado em um Israel restaurado (Evangelical Dictionary of Theology, pg. 317).

Alguns fatos importantes a serem levados em consideração:

Ø John Darby e Margaret MacDonald nunca estudaram teologia. Seria difícil alguém aceitar uma tese em medicina por uma pessoa que nunca estudou medicina, mas muitos aceitam a tese teológica de Darby. Ele acreditava que só o grupo no qual ele pertencia era a igreja verdadeira.

Ø Darby acreditava que a Igreja jamais havia tomado o lugar de Israel: “o Israel do Antigo Testamento e a igreja do Novo Testamento são instituições sucessivas na história bíblica... Tendo dois programas de redenção diferentes e separados – Israel: político, terreno, e legalístico; a Igreja: espiritual, celestial, e graciosa.” (Evangelical Dictionary of Theology, pg.344). Ele ensinava que as promessas feitas no Antigo Testamento para Israel serão cumpridas quando a Igreja for arrebatada, pois quando a Igreja sair de cena, então o Senhor vai voltar a tratar com os judeus.

Ø A pessoa que realmente foi responsável pela propagação do arrebatamento pré-tribulacionista foi Cyrus Ingreson Scofield (1843-1921). Em 1909 ele publicou a Bíblia de Referência Scofield, onde ele colocou os estudos de Darby no rodapé da Bíblia. Os estudos daquela Bíblia passaram a ser considerados como a verdadeira Palavra de Deus, o que jamais pode acontecer!

Ø Aqui no Brasil, essa foi uma das primeiras (senão a primeira) Bíblias de estudo, o que fez com que todos tivessem esses ensinos como a única verdade sobre o futuro da Igreja.

A Bíblia Scofield:

Ø Como foi dito anteriormente, muitos consideram os estudos da Bíblia Scofield como algo inerrante. Interessante que a segunda edição dessa Bíblia, em 1967, trouxe mudanças significativas nas anotações, pois eles viram que havia contradições em algumas passagens.

Alguns Exemplos de Problemas Encontrados na Bíblia Scofield:

Ø Em Gênesis 5: 22, a Bíblia Scofield fala assim em seu comentário: “Enoque, transladado para não ver a morte antes do juízo do dilúvio, é um tipo daqueles que serão transladados antes do juízo apocalíptico (I Tes. 4:14-17)”. Mas o problema é que em nenhum lugar da Bíblia temos Enoque como um tipo da Igreja Arrebatada. A passagem que Scofield cita (I Tes. 4:14-17) não menciona nada de nós sermos transladados antes do “juízo apocalíptico” e não faz nenhuma referência a Enoque.

Ø Em Gênesis 9:26, Scofield diz que “Toda revelação divina é através dos homens semitas ...”. Problema com essa declaração: Lucas não era semita. Além disto, a Bíblia é clara que Deus se revela na natureza (Salmos 19; 104; Atos 14:16-17; Romanos 1:18-20). Portanto, as revelações de Deus não vêm somente por homens semitas.

Ø Em Gênesis 19:36, Scofield faz a seguinte afirmação sobre Ló e Abraão: “Os homens são representantes do crente mundano e espiritual”. A minha pergunta para essa afirmação é: haverá no céu algo como crente “mundano” e “espiritual”? Será que o Senhor vai querer ter ao Seu lado “crentes mundanos”? Isso parece mais uma licença para pecar e continuar na imaturidade!

Ø Sobre a diferença do Reino de Deus para com o Reino dos Céus em Mateus 3:2, Scofield diz: “Quando contrastado com o reino universal de Deus, o reino dos céus inclui apenas os homens na terra, excluindo os anjos e outras criaturas. O reino dos céus é a esfera terrena de profissão como se vê pela inclusão daqueles que foram designados como trigo e joio...”. Em Mateus 6:33, a Bíblia Scofield diz, “A expressão, ‘reino de Deus’, embora usada em muitos casos como sinônimo de ‘reino dos céus’, deve ser distinguida em alguns exemplos (Mt. 3:2). Tal como o reino dos céus, o reino de Deus é realizado no governo de Deus na presente dispensação e também será cumprido no futuro reino milenial.” Confuso, não?!

A grande maioria dos teólogos afirma que os termos “reino de Deus” ou “reino dos céus” significam a mesma coisa, isto é, o reinado soberano, dinâmico e escatológico de Deus. Os Evangelhos usam três termos para expressar a idéia do reino de Deus: he basileia tou theou (o reino de Deus), he basileia ton ouranon (o reino do céu(s)) e he basileia (o reino). “A equivalência das expressões Reino de Deus e Reino dos Céus é indicada pelos seus conteúdos, contextos e imutabilidade nos Evangelhos. A distinção entre o reino de Deus e o reino dos céus não tem base exegética. O grego para “o reino do céu(s)” é a tradução literal do termo judaico malekut samayim, onde “céu” troca “Deus” pela reverência que havia para com o nome de Deus, assim como adonay (senhor, mestre) havia trocado o termo Yahweh (Senhor)” (The IVP Dictionary of the New Testament, Daniel Reid, pg. 641). Scofield afirma haver diferenças entre os dois reinos, mas através de um estudo mais profundo da Palavra, podemos ver que os dois termos se referem à mesma coisa. Os autores do N.T. apenas usaram expressões diferentes para a mesma coisa.

Ø Scofield comenta em I Coríntios 2:14, que há três grupos de homens: o natural (homem não renovado), o espiritual (o homem renovado cheio do Espírito), e o carnal (o cristão “criancinha”). Se mantivermos esses três grupos, como Scofield afirma haver, o crente carnal tem licença para pecar, pois ele é apenas uma “criancinha” e ainda não sabe distinguir bem do mal. Mas sabemos que isto não é verdade. Toda vez que alguém é convertido – nascido do Espírito –, essa pessoa se torna espiritual, pois entende as coisas do Espírito, visto que o Espírito Santo habita nela. Paulo estava falando que os cristãos em Corinto estavam agindo imaturamente e carnalmente, já que eles se achavam “espirituais” e “maduros”. Nós, como cristãos, às vezes nos comportamos como pessoas naturais-carnais, assim como os crentes em Corinto. Mas isso não quer dizer que existe uma classe de pessoas chamada “crente carnal”. Há apenas duas classes de pessoas: as salvas e as não salvas - não existe um meio termo. Uma vez que você é justificado (nasce do espírito), você se torna espiritual!